A maior player do mercado de streaming on demand do mundo ainda é a Netflix. Responsável pela extinção das locadoras, a plataforma de streaming conseguiu revolucionar o mercado de consumo de vídeo em 2007 dando o poder para o espectador escolher o que ele quer ver quando ele quiser ver.
Com dominância completa no mercado por falta de concorrência durante a última década, a Netflix acabou se tornando uma empresa de US$ 116 bilhões. Sua receita cresceu de US$ 1,2 bilhão naquele ano para US$ 15,7 bilhões em 2018, um salto de 1200%.
Eliminando a prática cultural de alugar vídeos, a Netflix foi além e começou a produzir conteúdo original exclusivo. Em 2013, a companhia preparou o lançamento da elogiadíssima da primeira temporada de House of Cards contando com David Fincher na direção e Kevin Spacey como protagonista.
A qualidade da escrita, das atuações e também da direção da temporada como um todo conseguiu conquistar a atenção dos assinantes pela trama política de traição e fome de poder. Ainda em 2013, a plataforma lançou outras duas séries como atrativos para novos assinantes: Hemlock Grove e Orange is the New Black.
A partir disso, a plataforma não deixou de produzir novos conteúdos em um volume massivo. A aposta deu certo e não foi apenas uma vez. Sucessos como 13 Reasons Why e Stranger Things mostraram o absoluto poder da plataforma em manter seus assinantes engajados. Porém, a cada duas séries que faziam sucesso com muita audiência, outras cinco simplesmente não conseguiam cobrir seus custos como ocorreu com as canceladas The OA, Sense8, Marco Polo, Chambers, Santa Clarita Diet, entre diversas outras.
Gastando milhões de dólares na produção em massa de conteúdo, a Netflix corre sério risco de falir por causa de suas contas deficitárias. A empresa opera no vermelho há anos e ainda assim insiste em continuar produzindo entretenimento caro. Os sinais de fracasso já são claros pelo modo constante que a empresa cancela projetos rapidamente.
Nos últimos quatro anos, a empresa sediada na Califórnia já perdeu US$ 6,6 bilhões em operações. Isso está diretamente relacionado ao fato de que produzir, criar e licenciar conteúdo é um empreendimento caríssimo. Requer tempo, perícia, equipamento, profissionais competentes e nomes famosos.
Mas como é que uma empresa que apresenta um prejuízo operacional de US$ 6,6 bilhões em quatro anos ainda continua operando? Através de dívidas, muitas dívidas. A Netflix conseguiu se endividar a uma taxa impressionante: ela aumentou sua dívida em US$ 9,5 bilhões nos últimos quatro anos para financiar sua operação.
Entretanto, mesmo com a dívida, esse não seria o problema que pode acarretar no fracasso futuro e provavelmente iminente da plataforma. Alavancar ativos para fazer mais dinheiro é uma estratégia que as empresas usam para crescer. E Wall Street não se importa em financiar uma empresa que queime caixa, desde que ela continue crescendo.
Isso era uma verdade até 2019. A Netflix realmente só crescia, até que tudo mudou.
Os novos donos do jogo
No final de 2007, a Netflix tinha apenas 7,5 milhões de assinantes. De acordo com seu último balanço, a empresa contava com 151 milhões de assinantes no segundo trimestre de 2019.
Entretanto, algo mudou significativamente no cenário. No último trimestre, a Netflix perdeu 130 mil assinantes nos EUA. Só isso já seria um sinal de alerta bastante claro para qualquer empresa excessivamente endividada. Pela torrente de conteúdo original de qualidade duvidosa, os cancelamentos constantes e agora o recuo de seu catálogo, a empresa está em sérios apuros.
O recuo dos assinantes é algo lógico: a Netflix está cara enquanto novos serviços como a Amazon Prime, HBO Max, Disney+, Apple TV+ e Peacock já atuam ou atuarão em breve no mercado oferecendo uma vasta gama de conteúdo de qualidade por um preço significativamente menor.
A assinatura padrão da Netflix custa US$ 12,99. A Disney definiu o preço da sua oferta em US$ 6,99, o que abalou o mercado inicialmente. Então a Apple lançou o Apple TV por US$ 4,99, mais barato que os mais baratos. No Brasil, tanto a Apple quanto a Amazon Prime custarão apenas R$ 9,90 enquanto a Netflix custa R$ 21,90 no plano mais simples.
Pelo que sabemos do modelo de negócios da Netflix, esses preços não são lucrativos nem para a Disney nem para a Apple. A taxa de US$ 12,99 da Netflix foi definida depois que a empresa percebeu que preços menores eram insustentáveis, principalmente para uma empresa movida por dívidas e empréstimos bilionários.
É justamente a dívida operacional que explica por que a Netflix estará no lado perdedor da guerra do streaming. Tanto a Disney quanto a Apple estão nadando em dinheiro. Em 2018, a Disney apurou um lucro operacional de US$ 14 bilhões, enquanto a Apple fez impressionantes US$ 77 bilhões. Já a Amazon opera em alta de US$ 59 bilhões no primeiro trimestre de 2019.
Os concorrentes também estão usando seus recursos financeiros superavitários para roubar programas consagrados na Netflix. Friends, a série mais popular da Netflix, mudará para o HBO Max em 2020. The Big Bang Theory, outro sucesso, também pode mudar para o HBO Max. The Office sairá em 2020 e será oferecido no serviço da NBC.
Para tentar conter essas perdas, a Netflix acaba de licenciar Seinfeld por US$ 500 milhões por tempo determinado. As atitudes desesperadas da empresa em um modelo de negócios simplesmente inviável para sua balança orçamentária não vão impedir o inevitável.
Praticamente todos os concorrentes não precisam lidar com o problema financeiro da Netflix. Enquanto eles podem ter segmentos do mercado operando com custo inferior ao necessário oferecendo produtos de qualidade por um preço imbatível, a Netflix não poderá fazer mais nada. Uma redução no custo da assinatura seria um suicídio completo. Portanto, é mais interessante para ela definhar aos poucos enquanto espera que um milagre em seu catálogo aconteça.
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